Resenha Crítica | O Contador de Histórias (2009)

O Contador de HistóriasAqueles que acompanham pela primeira vez Roberto Carlos Ramos narrando um de seus contos fantasiosos jamais imaginaria que este sujeito, reconhecido como um dos dez melhores contadores de histórias do mundo, teve uma infância difícil e entregue a marginalidade ao ser deixado pela mãe ainda pequeno na Fundação  Estadual do Bem-Estar do Menor, a FEBEM. É este extenso episódio da vida de Roberto Carlos que o diretor Luiz Villaça se interessa com maior intensidade. Casado com a atriz Denise Fraga, o cineasta, inclusive, deixa para trás a péssima impressão que ficou com o fraco “Cristina Quer Casar”, protagonizado pela sua esposa.

Com seis anos de idade, Roberto Carlos Ramos (nesta fase vivido por Daniel Henrique) vem de uma família pobre, tendo nada menos que nove irmãos. Sua mãe, interpretada por Ju Colombo, assiste a um comercial da FEBEM no vizinho (como narrado no filme, toda a comunidade onde vivia Roberto se juntava para ver televisão somente aos domingos em uma única casa) e acredita que este lugar tornará o futuro de seu filho muito melhor. A sua expectativa é que Roberto saia de lá como um doutor, mas a realidade, aquela que já estamos bem familiarizados, transforma Roberto em um pequeno marginal quando aos sete anos se muda para uma ala frequentada por outros marginais de até catorze anos. Entre uma fuga e outra (foram calculadas nada menos que 132 tentativas), Roberto, agora interpretado por Paulinho Mendes, conhece a pedagoga Margherit Duvas (a portuguesa Maria de Medeiros, em uma interpretação marcada por incríveis sutilezas), que diz estar brevemente no Brasil para uma pesquisa sobre “crianças irrecuperáveis”.

Fica para o espectador interessado em desvendar o choque deste convívio. Basta somente informar que durante esse processo Roberto Carlos descobrirá uma paixão pela leitura. O diretor Luiz Villaça retrata esta história com ternura e não permite que ações cruéis, jamais suavizadas pelo roteiro, transformem o drama em mais um título derivativo de outros argumentos violentos de nosso cinema. A imaginação do personagem não encontra uma tradução muito exemplar na tela. Porém, as mudanças que Margherit impõe na vida de Roberto Carlos são os maiores valores de “O Contador de Histórias”. Não deixem de ver a sequência de créditos finais, onde o verdadeiro contador de histórias dá às caras para entreter ao ar livre um público formado por crianças e adultos.

Título Original: O Contador de Histórias
Ano de Produção: 2009
Direção: Luiz Villaça
Elenco: Paulinho Mendes, Maria de Medeiros, Victor Augusto da Silva, Marco Antonio, Cleiton Santos, Ju Colombo, Malu Galli e Chico Diaz.
Cotação: 3 Stars

Resenha Crítica | Coco Antes de Chanel (2009)

Coco Antes de ChanelA cineasta de cinquenta anos Anne Fontaine é uma das mais produtivas da indústria francesa de cinema. Exemplo disto é a sua filmografia, onde nada menos que seis títulos constam como lançados ao longo da década passada. O sucesso vem de sua habilidade em trabalhar de maneira acessível os dramas complexos de seus personagens. E “Coco Antes de Chanel”, embora lide com a história real da grande estilista Gabrielle Chanel, não escapa de ser outro filme com personalidade reconhecível da diretora.

Somos apresentados para vários episódios particulares de Gabrielle. O filme se abre com uma bela sequência onde ela, ainda pequena e incorporada pela atriz Lisa Cohen, é levada para um colégio interno após a morte de sua mãe e a profissão de seu pai impossibilitado de criar os próprios filhos. Minutos depois, somos transportados ao tempo onde Gabrielle, agora vivida por Audrey Tautou, ganha a vida como dançarina de um bar povoado por homens ricos. É aí onde conhece o comerciante de tecidos Étienne Balsan (Benoît Poelvoorde), com quem passará a viver, deixando prevalecer o seu talento com corte e costura e se apaixonar pelo britânico milionário Arthur (o americano Alessandro Nivola, dominando bem a língua francesa).

Todos os fãs do trabalho de Coco Chanel sabem que Arthur foi o grande amor de sua vida, mas é ao retratá-lo que Anne Fontaine perde todo o controle da encenação. Para dizer a verdade, a única razão de se ver “Coco Antes de Chanel” nada mais é do que uma sensibilidade feminina comprovada em alguns aspectos. O belo trabalho de figurino ganha realce todo especial e a trilha sonora de Alexandre Desplat se encaixa com harmonia na narrativa, especialmente o tema “Abandono”. Por fim, também deve ser destacado a minuciosa performance de Audrey Tautou, excelente ao expressar um pouco de frieza da própria natureza de Gabrielle Chanel e bem-sucedida em alguns maneirismos desta mulher, como a elegância com que fuma um cigarro ou segura um chapéu. O restante nada mais é do que um romance lacrimoso. Verdade que o título já adverte que esta é uma história de uma mulher a frente de seu tempo antes de sua ascensão, mas daria muito bem para estender sequências especiais como aquelas onde Chanel entra em contato com as mãos em tecidos e acessórios confeccionando trajes que foram revolucionários no sentido de valorizar e deixar exposta a beleza de uma mulher.

Título Original: Coco avant Chanel
Ano de Produção: 2009
Direção: Anne Fontaine
Elenco: Audrey Tautou, Alessandro Nivola, Benoît Poelvoorde, Marie Gillain, Emmanuelle Devos, Régis Royer, Etienne Bartholomeus, Yan Duffas e Lisa Cohen.

Resenha Crítica | Halloween 2 (2009)

Halloween 2“Cavalo Branco: relativo ao instinto, pureza e capacidade do corpo emanar forças poderosas e emocionais, como raiva com subsequente caos e destruição”.

Após a grata surpresa que foi a mistura de refilmagem e prequel de “Halloween“, passou-se a aguardar com muita ansiedade a sequência do filme que novamente trás Rob Zombie como diretor. O fato de agora o também vocalista do grupo “White Zombie” estar livre da dura responsabilidade do contato com um clássico do terror tornavam as coisas ainda mais interessantes. Mas eis que Rob Zombie atinge aquela falta de qualidade que o atormentou em sua estreia como cineasta, “A Casa dos 1000 Corpos”.

O prólogo de “Halloween 2” é perturbador. Passamos a saber o que aconteceu com Laurie Strode (Scout Taylor-Compton). Vemos que ela aparentemente deu fim no maníaco Michael Myers (Tyler Mane) e que imediatamente é levada a um hospital. Nesta mesma noite, Myers surge para capturá-la em uma longa sequência que passamos a descobrir que é um pesadelo, o que não invalida esta que é uma homenagem competente ao “Halloween 2 – O Pesadelo Continua” de Rick Rosenthal. Só um dos vários sonhos perturbadores comprovados em noites mal dormidas que não são superadas nem com consultas com a psicóloga Barbara Collier (participação especial da inesquecível Margot Kidder). Isto dois anos após os eventos do filme anterior, com Laurie passando a viver com sua melhor amiga e sobrevivente do massacre do Dia das Bruxas Annie (Danielle Harris) e o xerife Lee Brackett (Brad Dourif). Um intervalo de aparente paz até que Michael Myers retorne para criar uma nova pilha de cadáveres.

Esta é uma premissa similar aos melhores episódios da série ou mesmo a versão do filme original conduzida por Rob Zombie. O problema é o roteiro escrito com pouca inspiração pelo diretor. Aqui ele faz com que o mal de Michael Myers seja essência de toda a família desestruturada e que agora busca vingança pela rejeição de Laurie, que não sabe que é irmã do mascarado. A frase que estampa o poster, “Família é para sempre”, reforça esta interpretação. A queixa é que Rob Zombie faz com que a matança de Michael Myers até o seu destino seja arrastada e até mesmo gratuita. Chega um momento em que o psicopata mata o dono de uma boate e uma stripper sem qualquer necessidade. Mas nada que se aproxime da calamidade da total modificação aplicada na personalidade do detetive Sam Loomis (Malcolm McDowell), que se transformou em um escritor arrogante e oportunista ao publicar um livro polêmico sobre a pesquisa de anos que fez sobre Michael Myers. Essa incorreção, junta a outras espalhadas ao longo do terror, transformam essa nova investida de Rob Zombie em algo que pode ser definido como patético.

Título Original: Halloween II
Ano de Produção: 2009
Direção: Rob Zombie
Elenco: Scout Taylor-Compton, Tyler Mane, Chase Wright Vanek, Danielle Harris, Brad Dourif, Malcolm McDowell, Margot Kidder, Caroline Williams, Dayton Callie, Richard Brake, Octavia Spencer, Brea Grant, Mary Birdsong, Betsy Rue e Sheri Moon Zombie.
Cotação: 2 Stars

10 Grandes Momentos em 2009

O ano de 2009 foi positivo para o cinema. Além de muitos índices apontarem que o público se tornou mais presente nas salas de projeção em comparação de anos mais recentes, o cinéfilo brasileiro pôde tanto prestigiar o sucesso que muitos filmes nacionais fizeram, como “Se Eu Fosse Você 2“, “Divã“, “A Mulher Invisível” e “Os Normais 2 – A Noite Mais Maluca de Todas“, quanto uma diversidade muito expressiva de filmes das mais diversas origens entrando no circuito.

Portanto, vamos relembrar grandes momentos do ano passado através de cenas e clipes de filmes que de alguma maneira marcou o público. Mas que fique claro que não estão presentes os melhores filmes lançados em 2009, um assunto que em breve renderá muitas postagens por aqui. Aproveitem e revejam estas cenas divertidas e emocionantes. Só fiquem atentos porque muitas delas podem conter spoiler.

http://www.youtube.com/v/R0BbQU7JLXg&hl=pt_BR&fs=1&

http://www.youtube.com/v/g91OXPBWrFw&hl=pt_BR&fs=1&

http://www.youtube.com/v/qlZyOoudxoM&hl=pt_BR&fs=1&

http://www.youtube.com/v/H8UGNBJULxE&hl=pt_BR&fs=1&

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http://www.youtube.com/v/GroDErHIM_0&hl=pt_BR&fs=1&

http://www.youtube.com/v/G5Tr8US_FYQ&hl=pt_BR&fs=1&

http://www.youtube.com/v/imqoVKiTRfc&hl=pt_BR&fs=1&

http://www.youtube.com/v/EDXFAXMav7g&hl=pt_BR&fs=1&

http://www.youtube.com/v/V28iwZ-mcP0&hl=pt_BR&fs=1&

Filmes relacionados (na ordem): “A Proposta” | “A Partida” | “Deixe Ela Entrar” | “Simplesmente Feliz” | “(500) Dias com Ela” | “Up – Altas Aventuras” | “Arraste-me Para o Inferno” | “Hanami – Cerejeiras em Flor” | “Dúvida” | “Tudo Azul

Up – Altas Aventuras

Up - Altas AventurasNão há dúvidas de que a Disney sempre conferiu um nível impecável de qualidade em suas animações em longa-metragem. Exemplos como “Branca de Neve e os Sete Anões”, “Alice no País das Maravilhas” e “A Bela e a Fera” não são considerados à toa como grandes clássicos destinados ao público infantil. Recentemente, este harmonioso círculo não foi rompido, mas é possível perceber uma mudança de tendências. Isto se aplica nas pretensões que há de realizadores em fisgarem também o público adulto. Não poderiam terem se saído melhor com “Up – Altas Aventuras”, vencedor do Oscar de melhor animação e  de trilha sonora (lindamente composta por Michael Giacchino) além de indicado nas categorias de melhor edição de som, roteiro original e, surpresa, melhor filme.

Se “Up – Altas Aventuras” fosse um curta-metragem centrado na sequência de toda a vida de casado de Carl (dublado na versão original por Edward Asner) e Ellie já seria o suficiente. Porém, o filme tem muito para nos mostrar quando o personagem principal, um velhinho ranzinza vendedor de balões, perde sua mulher e decide realizar o sonho que eles tinham de viverem em um penhasco na América do Sul. Para isto, ele preenche o teto de sua casa com milhares de balões ao ponto deles serem capazes de levá-lo aos ares. O problema é que ao alçar voo ele vê o persistente escoteiro Russell na varanda da residência. Sem muita escolha, Carl suporta essa inusitada companhia em meio as florestas cheias de animais selvagens e cachorros que se comunicam como humanos, o que aponta que há outra pessoa vivendo neste ambiente quase inóspito.

O ritmo da animação é de aventura e certamente não haverá ninguém que não passe a se divertir para valer. Mesmo assim, “Up – Altas Aventuras” tem muito mais para oferecer, especialmente por vermos o nome de Pete Docter como responsável por esta mais nova criação da Pixar. O diretor de “Monstros S.A.” (em minha opinião, a melhor animação em longa-metragem já produzida) tem aqui uma história poderosa como poucas vezes já vista sobre aquilo que podemos considerar como a etapa final da vida humana. Tendo setenta e oito anos, Carl experimenta diariamente a exaustão que sua idade inevitavelmente apresentaria. Apesar disto, ainda há fôlego para seguir em frente, com o desejo da realização de seu sonho e as lembranças que armazena em sua memória com sua esposa Ellie. O resultado disto é uma das celebrações à vida mais emocionantes que o espectador poderia apreciar.

Título Original: Up
Ano de Produção: 2009
Direção: Pete Docter
Vozes: Edward Asner, Jordan Nagai, Christopher Plummer, Bob Peterson, Delroy Lindo e Jerome Ranft.
Cotação: 4 Stars

Resenha Crítica | Preciosa: Uma História de Esperança (2009)

Preciosa: Uma História de EsperançaA princípio, tudo parecia conspirar contra “Preciosa – Uma História de Esperança”. Mesmo sendo uma adaptação de um consagrado romance da poetisa Sapphire, os principais envolvidos não tinham uma boa reputação perante público e crítica no que está relacionado a qualidade de seus trabalhos antes do envolvimento neste projeto independente. Claro exemplo é Mo’Nique, com uma carreira dedicada a papéis simplesmente sofríveis. Ou mesmo Lee Daniels, cujo trabalho anterior, “Matadores de Aluguel”, foi uma primeira experiência frustrante por trás das câmeras. As seis indicações ao Oscar, com duas vitórias nas categorias de roteiro adaptado e atriz coadjuvante, são as chances dos intérpretes e realizador em procurarem a partir de agora por produções mais promissoras e desafiadoras.

A história de Claireece Jones, conhecida como Precious (a estreante Gabourey Sidibe), é brutal. Se não bastasse qualquer preconceito que sofreria por ser uma jovem cidadã negra, obesa e semianalfabeta em plena década de 1980, Precious, após ser abusada pelo seu pai por mais uma vez, está grávida de seu segundo filho e come o pão que o Diabo amassou nas mãos de sua mãe Mary (Mo’Nique), que a humilha e a espanca frequentemente. Precious só passa a receber chances de reverter o trágico quadro de sua vida ao ser matriculada em um colégio para alunos especiais, onde recebe todo o apoio de sua professora, Ms. Rain (Paula Patton, muito bem), e as alunas que têm problemas pessoais ao ponto de prejudicarem os estudos.

Mesmo que Precious comece a driblar todas as adversidades, não há momento de paz algum em seu cotidiano. Para dar veracidade a vida dessa personagem, Lee Daniels não poderia contar com um elenco melhor, que merece um destaque todo especial, a começar pela novata Gabourey Sidibe, devastadora pela entrega ao papel. Mo’Nique, especializada em desempenhos cômicos em filmes sem nenhuma expressão, faz com que um monstro em pessoa adquira um mínimo de humanidade através de um monólogo que figura como uma das sequências mais antológicas entre os lançamentos do último ano. No entanto, quem de fato surpreende é a cantora Mariah Carey. Encarada como piada ao se envolver com o fiasco “Glitter”, aqui ela assume o papel que seria de Helen Mirren com uma performance cheia de nuances. Se a Academia não tivesse um preconceito tão expressivo com “cantrizes”, Carey seria a pessoa ideal a ocupar uma vaga na categoria de melhor atriz coadjuvante injustamente reservada para Penélope Cruz.

Dito tudo isto sobre o fantástico trabalho das atrizes, é necessário também refletir sobre a força da narrativa de “Preciosa – Uma História de Esperança”, o melhor longa-metragem entre os indicados a última edição do Oscar. É mostrado sem cerimônias o triste universo de Precious, havendo algum refúgio somente com as suas fantasias onde ela se vê como uma estrela pop. A violência é incômoda e muitos se sensibilizaram com ela. O que não impede que seja imaginado no desfecho cru de Precious um caminho onde a esperança prevalece.

Título Original: Precious: Based on the Novel Push by Sapphire
Ano de Produção: 2009
Direção: Lee Daniels
Elenco: Gabourey Sidibe, Mo’Nique, Paula Patton, Mariah Carey, Lenny Kravitz, Sherri Shepherd, Stephanie Andujar, Chyna Layne, Amina Robinson, Xosha Roquemore, Angelic Zambrana, Aunt Dot, Nealla Gordon e Barret Helms.

Bastardos Inglórios

Bastardos InglóriosEm meio a tantos filmes com suas missões sagradas de focarem os horrores do Holocausto, só mesmo uma mente criativa como a de Quentin Tarantino para revigorar o que já estava começando a se esgotar. Assim como testemunhado em “Kill Bill”, era grande o risco de sua mais recente realização, “Bastardos Inglórios”, passar batido por todos os membros que compõem a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas. As oito indicações recebidas na última edição do evento mostram que “Pulp Fiction – Tempo de Violência” não será mais a única obra de Tarantino a ter os seus méritos devidamente reconhecidos.

“Bastardos Inglórios” trata de apresentar os inúmeros personagens totalmente ficcionais que trariam dados totalmente distintos (e absurdos) sobre a Segunda Guerra Mundial. A queda da Alemanha teria como pivô ninguém menos que a jovem francesa Shosanna Dreyfus (Mélanie Laurent) com o seu mirabolante plano de vingança contra os nazistas responsáveis pelo massacre de sua família a mando do coronel Hans Landa (o espetacular Christoph Waltz, Oscar de melhor ator coadjuvante). Dividido em alguns capítulos, o roteiro passa a se deslocar para outras linhas narrativas, como aquela protagonizada por Brad Pitt encarnando o judeu americano Aldo Raine (que passa a exterminar junto ao seu exército qualquer nazista que vejam pela frente) e da atriz alemã Bridget von Hammersmark (Diane Kruger, finalmente em um papel que valorize o seu extremo charme e talento) que desempenhará papel importante na trama.

Quentin Tarantino desapontou parte de seus maiores fãs ao desenvolver junto com o seu grande amigo Robert Rodriguez o projeto “Grindhouse“, um fiasco que consistia na junção de dois filmes de péssima qualidade assistidos pelo preço de um. Esta fase menor de sua carreira é deletada em “Bastardos Inglórios”, um misto de todos os melhores elementos de seus trabalhos anteriores com resultados revigorantes. É verdade que ao contrário do que Aldo Raine aponta no desfecho de “Bastardos Inglórios”, não estamos diante da obra-prima definitiva do cineasta – a pobre narração de Samuel L. Jackson jamais se justifica e há pelo menos duas sequências que se alongam um pouco mais do que deveriam. O que não arma barreiras para o título se juntar aos mais dignos da filmografia de seu realizador, que com um clímax bárbaro consegue concretizar uma punição dos judeus contra nazistas que só a magia do (seu) cinema seria capaz de registrar.

Título Original: Inglourious Basterds
Ano de Produção: 2009
Direção: Quentin Tarantino
Elenco: Brad Pitt, Mélanie Laurent, Christoph Waltz, Eli Roth, Michael Fassbender, Diane Kruger, Daniel Brühl, Til Schweiger, Gedeon Burkhard, Jacky Ido, Mike Myers, Julie Dreyfus e Martin Wuttke. Narração de Samuel L. Jackson.
Cotação: ****

 

Distrito 9

Distrito 9Peter Jackson vacilou no ano passado com a adaptação do romance de Alice Sebold, “Um Olhar do Paraíso”, onde a única razão de apreciá-lo era o desempenho perturbador do ator Stanley Tucci. Um equívoco que Peter compensa totalmente com sua intervenção como produtor na ficção científica “Distrito 9”, cujos reconhecimentos artísticos vieram à tona com quatro indicações ao Oscar: melhor filme, roteiro adaptado, efeitos especiais e edição.

A ideia de se fazer “Distrito 9” foi comprada desde o instante que Peter Jackson assistiu ao projeto de aproximadamente seis minutos “Alive in Joburg”, de 2005. Foram convocados o mesmo realizador, Neill Blomkamp, e o estreante Sharlto Copley como protagonista (que também deu às caras no curta-metragem, além de ser uma grata revelação). O Distrito 9 do título é uma “instalação” na África do Sul habitada por alienígenas chamados de “Caramões” por causa da aparência similar a dos crustáceos.

Anos após os milhares de alienígenas viverem em situações intoleráveis, a empresa Multi-National United escala o burocrata Wikus van der Merwe (Sharlto Copley) para apresentar uma ordem emitida para a transferência de área para cada “Camarão”. Tudo passa a sair do controle quando Wikus descobre ferramentas desenvolvidas pelos alienígenas para saírem do planeta e ao ter seu DNA modificado ao inalar o combustível preso em uma cápsula. Seu corpo passa por mudanças radicais (no melhor estilo “A Mosca”) e sem ninguém para ajudá-lo não há outra solução do que em apoiar a saída dos extraterrestres da Terra para alguma possibilidade de cura, nem que para isto tenha que enfrentar os verdadeiros vilões da história: os próprios humanos.

Apesar deste argumento promissor, “Distrito 9” nos dá uma impressão negativa em seus primeiros minutos. Em formato de documentário, o filme é capaz de quase espantar o espectador com o tédio que provoca, mesmo que aos poucos desse primeiro ato seja muito bem registrado a aparência impressionante dos alienígenas. De qualquer forma, o filme vai ganhando vida até finalmente mostrar a que veio, proporcionando uma experiência enriquecedora e cheio de temas atuais a serem debatidos, características essenciais para uma fita digna do gênero.

Título Original: District 9
Ano de Produção: 2009
Direção: Neill Blomkamp
Elenco; Sharlto Copley, Jason Cope, Nathalie Boltt, Sylvaine Strike, Elizabeth Mkandawie, John Sumner, William Allen Young e Nick Blake.
Cotação: 4 Stars

Avatar

AvatarApós o megassucesso “Titanic”, James Cameron se envolveu com a criação da série “Dark Angel” (cujos quarenta e dois episódios foram protagonizados por Jessica Alba), a produção da refilmagem de “Solaris” e documentários como “Ghosts of the Abyss” e “Aliens of the Deep” e uma ponta no divertido “A Musa”, de Albert Brooks. A razão de ficar tanto tempo empenhado nestes projetos e não na direção é somente uma: “Avatar”.

Embora Cameron tenha aguardado a tecnologia cinematográfica atingir um ponto fundamental para a criação de Pandora, a imensa floresta habitada pelas criaturas azuis com três metros de altura que aparecem na história, os planejamentos das cenas e a construção do roteiro foram um processo iniciado um tempo depois de “Titanic”. Esses anos de dedicação de toda a equipe de “Avatar” poderiam resultar em um enorme fiasco (o filme, em sua estreia, não atingiu as expectativas dos investidores, um episódio similar ao de “Titanic”). Grande engano. “Avatar” é, segundo as estatísticas apontam, o filme a faturar a maior bilheteria da história do cinema.

Porém, é necessário refletir melhor sobre toda a tecnologia 3D. Apontada como o recurso que garantirá o futuro do cinema, James Cameron não é bem-sucedido ao pretender uma revolução a esse tipo de trabalho. Os departamentos técnicos são primorosos, mas os óculos 3D pouco tem a fazer durante a sessão. É difícil se impressionar mais através de truques onde os personagens ficam mais próximos do público por segundos e objetos e elementos que se aproximam durante a ação. As cópias em formato convencional certamente devem oferecer a mesma experiência.

No fim das contas, o que torna “Avatar” uma ótima aventura científica é mesmo a sua história e seus personagens. Bem, mas vamos nos limitar aos “mocinhos”, já que os vilões desempenham o papel manjado de sempre: são megalomaníacos, cheios de frases de efeitos das mais canalhas – pobres Stephen Lang e Giovanni Ribisi. Há quem aponte paralelos entre países de belezas naturais sendo diminuídas pelo Homem ou mesmo plágios de filmes que vão de “Dança com Lobos” à “Pocahontas”. Mas nada que diminua a eficácia do projeto, com sua capacidade ímpar de deslumbrar.

Título Original: Avatar
Ano de Produção: 2009
Direção: James Cameron
Elenco: Sam Worthington, Zoe Saldana, Sigourney Weaver, Stephen Lang, Joel Moore, Giovanni Ribisi, Michelle Rodriguez, Laz Alonso, Wes Studi, Dileep Rao e CCH Pounder
Cotação: 4 Stars

Educação

EducaçãoA cineasta dinamarquesa Lone Scherfig despontou com “Italiano Para Principiantes”, o décimo segundo filme a receber o certificado do movimento Dogma 95, cujas normas estão ligadas a forma modesta de se fazer cinema (câmeras sempre nas mãos ou ombros, filmagens em locações, uso de som direto, entre outras regras). Já no drama que se passa nos anos 1960 “Educação”, Lone trabalha de uma maneira, digamos, menos radical. E isto parece ter satisfeito as plateias e as premiações de cinema, como o Oscar, que o nomeou nas categorias de melhor filme, atriz e roteiro adaptado.

O roteirista Nick Hornby, responsável por textos que inspiraram comédias como “Alta Fidelidade”, “Um Grande Garoto” e “Amor em Jogo”, escreve seu primeiro trabalho para cinema com base nas memórias da inglesa Lynn Barber. Jenny (Carey Mulligan) é uma jovem de apenas dezesseis anos que ambiciona uma bolsa de estudos em Oxford. É uma aluna nata cujas notas dão como certo esta sua meta. A protagonista também se mostra uma mulher madura, que facilmente poderia ser confundida com alguém com o dobro de sua idade. Isto a faz ter grande fascínio por David (Peter Sarsgaard), um homem muito mais velho e que logo se tornará o primeiro grande amor de sua vida.

O relacionamento entre os protagonistas cresce, fazendo com que Jenny repense seus objetivos. Afinal, David é um homem rico, visto como bom partido pelos seus pais (interpretados por Alfred Molina e Cara Seymour) e com quem imagina um futuro perfeito em Paris, para onde viaja pela primeira vez graças a ele. Entre todo esse deslumbramento, passamos a descobrir que David está envolvido em um trabalho pouco notório, bem como a possibilidade de estar se apresentado como um homem que não é. Nasce assim uma grande dúvida em Jenny: vale continuar investindo nos estudos que certamente a farão seguir os mesmos passos da amarga Miss Stubbs (Olivia Willians, que brilha novamente após “Reflexos da Inocência”), sua professora, ou uma vida cheia de liberdade ao lado de David?

A certeza que se tem é a de que Jenny é uma personagem no mínimo fascinante de se acompanhar. Apesar de alguns desabafos que a transformam em uma garota fútil, como em acreditar que uma vida satisfatória se baseia em passeios pelas ruas e bares parisienses embalados por música jazz, na maior parte do tempo “Educação” a apresenta como um modelo a ser seguido. E Carey Mulligan, aproximadamente oito anos mais velha que sua personagem, a incorpora com uma convicção extrema. Mas não é só a atriz, que estreou nos cinemas como coadjuvante de “Orgulho e Preconceito” que merece destaque. O elenco de apoio é ótimo, com destaque para a rápida aparição da sensacional Sally Hawkins (a Poppy de “Simplesmente Feliz“), que protagoniza uma cena impressionante.

Título Original: An Education
Ano de Produção: 2009
Direção: Lone Scherfig
Elenco: Carey Mulligan, Peter Sarsgaard, Alfred Molina, Cara Seymour, Olivia Williams, Dominic Cooper, Rosamund Pike, Emma Thompson, Ellie Kendrick, Amanda Fairbank-Hynes e Sally Hawkins.
Cotação: 3 Stars